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Quebrando os mitos da escrita

Atualizado: 15 de nov. de 2020




A fim de conseguir uma boa história você tem que escrever bem. A promessa é que se você virar um artesão das palavras você automaticamente se torna um escritor. O que você precisa é de frases bem estruturadas, com todas as vírgulas no seu devido lugar, e uma cadência de eventos bem pensada. Então você senta e escreve. Aí vem um espírito, um demônio, ou a sorte do dia e a história magicamente aparece na sua frente. Nada mais errado do que isso.


Existem vários mitos sobre a escrita e vamos expurgar todos hoje! Todas essas lendas giram em torno de um único aspecto: escrever bem. Mas o que significa escrever bem? Escrever bem é moldar grandes personagens! É um conflito intenso! Diálogos cativantes, lindas metáforas, frases perfeitas e muitos e muitos detalhes descritivos. Com tudo isso basta soltar a criatividade. Parece uma receita para o sucesso, o problema é que isso não dá certo.


Para que fique claro, não sou contra nada disso, todos esses detalhes são excelentes para uma história, mas primeiro você tem que ter a história. Não adianta pensar na estrutura, na trama, nos formatos de roteiro, se você não tem a substância de tudo isso. Mas o que a série de vídeos ESCREVER COM ALMA propõe é que consigamos, passo a passo organizar o projeto da nossa história. Devemos primeiro pensar no QUE escrever e não no COMO escrever.


Neste vídeo vou falar de alguns mitos que cercam a escrita e mostrar que eles mais atrapalham do que ajudam. Vou mostrar que simplesmente sentar todos os dias e escrever não dá em nada, quero mostrar que uma escrita perfeita não significa uma história, que fazer por fazer um primeiro rascunho é irrelevante, que seguir o conselho de bons escritores pode mais atrapalhar do que ajudar e porque usar uma estrutura de história como A JORNADA DO HERÓI pode minar completamente o seu projeto.


O mito da escrita perfeita.


Aqui eu só preciso dizer uma coisa: 50 tons de cinza. É quase consenso, todos que leram o livro adoraram, mas acharam a escrita muito ruim. Então, em um primeiro momento, o mais importante e focarmos no poder da história, no sentimento, na verdade que ela expressa. Não adianta escrever bem, se não tem nada para escrever. É como um presente em que o papel de embrulho é melhor do que o presente em si.


A função biológica de uma boa história é anestesiar parte do cérebro para que ele embarque de corpo e alma no que estamos contando. É por isso que uma boa história não se parece com uma história, mas com a realidade. No livro 50 tons de cinza você não lia sobre a Anastasia, você era a Anastasia.


Então a primeira coisa não é querer aprender a escrever frases justamente como aquele autor que você gosta, mas sim querer aprender aquele tipo de história que dá frases como as daquele autor. As frases bonitas e bem construídas vem de um conteúdo bem definido.


O mito do “senta a bunda e escreve”


Existe um mito, uma crença eu diria que se você sentar a bunda em uma cadeira, todos os dias, e começar a escrever cegamente você terá uma história. E eu digo isso por conta própria: não funciona.


Vamos ser sinceros, no começo é muito legal, libertador até. Você tá lá empolgado, as palavras fluindo para o papel e você pensando, nossa! Poderia escrever para o resto da vida! E é muito legal porque aquela página em branco é muito agonizante e agora você vê palavras povoando aquele deserto! Nossa, não tem como dar errado! Já deu certo.


Até que lá pela página 32, ou 127, ou até mesmo a página 3, tudo acaba. Acabou o gás e, de repente, você está completamente perdido. Não tem ideia o que deve acontecer a seguir. Pega o livro de alguém famoso, dá uma olhada no índice, vê que a estrutura dele é completamente diferente da sua, mas a dele deu certo. Então começa a mudar a história, pensar em capítulos e os personagens começam se perder e você começa a chorar e fica puto, e pensa: eu sou uma merda de escritor, não nasci pra isso, desisto.


Calma. Não é que você seja uma merda de escritor, o lance é que você não aprendeu a desenvolver uma história.


E esse é o problema do “senta lá e escrever”. Você acha que só consegue escrever uma história legal se você libertar completamente a sua criatividade. Mas o fato é que criatividade precisa de contexto. Criatividade precisa estar presa a algo.


Contexto é o que cria significado e define o que importa, o que não importa e o porquê. E quando a gente simplesmente senta e escreve, não temos passado. Em um romance, o passado, o que aconteceu antes, é o que dá contexto. Então ao invés de libertar a criatividade, temos que prendê-la a um passado que lhe dará significado.


O mito do primeiro rascunho.


Aqui entra um pouco no mito do senta lá e escreve. Porque é obvio que vamos ter um primeiro rascunho e que esse primeiro rascunho será ruim, isso não temos dúvidas. Porém, ao invés de ter um rascunho aleatório é melhor que se tenha um primeiro rascunho de uma história. Que, desde a primeira leitura, sabemos que há algo ali. E saiba que aquele lance “não se preocupe, ninguém vai ler” é mentira. Porque você vai ler.


E como saber a diferença entre os um primeiros rascunho com história e um primeiro rascunho sem história? Se você ler e conseguir mexer as coisas de lugar, mudar um capítulo inteiro pra lá, outro pra cá, provavelmente você está com uma massa de história disforme na sua mão. Aí vem uma escola da escrita que traz a solução pra isso, que é o próximo mito, mas essa escola é tão ruim quanto as outras.


O mito da jornada do Herói.


É pop, ficou famoso, o herói relutante, o mundo comum, o chamado a aventura, o mago, o retorno, o cálice sagrado… legal… mas nada disso funciona. Porque se você começa por aqui, você começa a desenvolver a parte errada da história, a parte de fora, não a parte de dentro. Esses livros focam no O QUE e não no PORQUÊ.


A trama da história, os eventos que acontecem, devem forçar o protagonista a fazer uma difícil e específica mudança interna. E se você não sabe ESPECIFICAMENTE que mudança interna é essa, você não está pronto para criar a trama. Usar um livro como a JORNADA DO HERÓI sem ter a ALMA da história vai criar uma trama assim: “Meu livro é sobre uma série de eventos que mostram um grande e desafiador problema que alguém que eu não tenho ideia quem seja, terá que enfrentar.”


Isso nos leva ao próximo mito


O mito do modelo externo de estrutura de história


Basear a sua história em uma história acabada, em um livro, ou filme, ou um grande autor é um problema. Porque primeiro estamos confundindo história com trama, você não está baseando sua história na história de outra pessoa, mas sua história na trama de alguém. Todos esses modelos, ou livros, são baseados em romances terminados. Você acha que quem escreveu esses livros realmente se preocupou em estudar e compilar todas as tramas na sua obra?


E outra, muitas vezes grandes escritores não sabem ensinar. Simplesmente sabem fazer, mas não conseguem passar o conhecimento, simplesmente por não saberem que sabem. Vi a MasterClass do James Patterson, inclusive tem vídeo aqui no canal, ele fala várias coisas legais… que simplesmente não ajudam na hora de escrever. Ali é mais sua filosofia de vida, sua vontade, seu workflow, do que necessariamente um curso sobre escrita.


Você pode escrever uma história passo a passo com esses livros aqui, mas tenha certeza que não vai ser tão legal quanto os próprios livros que eles analisam. Então antes de focar nos eventos externos que vão acontecer na sua história, você tem que saber muito bem como o seu protagonista poderia reagir a esses eventos. Não que você já saiba, muitas vezes seu protagonista te surpreende com a decisão, mas você entende o PORQUE ele tomou determinado caminho.


Mas então se esses modelos de estrutura da história não funcionam, o que funciona? A solução está no que vimos no primeiro vídeo, aquilo que faz biologicamente nosso cérebro querer continuar a história, a dificuldade e superação interior do protagonista.


Criar a história interior vem primeiro, porque sem ela não adianta ter trama.


História é sobre alguém que luta com um problema que ele não pode evitar e como ele muda no processo. Entender isso faz toda a diferença para começar a escrever.


Agora me diz, como você vai escrever sobre a mudança de alguém sem saber o que ele era antes. Mudou de quê pra quê? Não dá pra escrever sobre um problema sem saber especificamente o que o causou. A vida nos mostra isso. Quando um grande problema aparece, provavelmente é algo que vem se acumulando há um bom tempo, senão há anos. Então a história que você está contando não começa na página um, mas sim muito tempo antes de chegar ali.


O romance deve começar “no meio da coisa”. O escritor Horácio em seu livro ARS POÉTICA já mostrou que é bem melhor começar no meio, do que no começo da coisa. No meio da coisa não quer dizer no centro da ação, em uma série de eventos sem sentidos, mas que há uma história prévia ao que está sendo escrito e as coisas que acontecem ao protagonista e como ele reage tem um PORQUÊ.


O seu romance começa na segunda metade da história, quando a sua trama entra em cena. A segunda metade, na verdade, é o seu romance. A primeira metade estabelece de onde veio o problema e quem é o protagonista para começar, de modo que a trama que você cria pode forçá-lo a lutar com esse problema e, no processo, mudar.


Como começa a divina comédia de Dante?


Da nossa vida, em meio da jornada,
Achei-me numa selva tenebrosa
Tendo perdido a verdadeira estrada.

É por isso que o ESCREVER COM ALMA foca na primeira parte do romance e vamos aprender a escrever essa primeira metade nos próximos vídeos. Só depois de termos o projeto da nossa história, poderemos iniciar a trama do nosso romance.


É isso pessoal! Lembre-se de se inscrever no canal para não perder nenhuma atualização! E agora, pode acessar o site ler é verbo.com para mais informações.


Obrigado pela audiência, um grande abraço, boa sorte e até a próxima! Valeu!


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